4ª Semana Eucarística da Paróquia Nossa Senhora da Conceição – João Monlevade-MG
Tema: Eucaristia: fraternidade e diálogo compromisso de amor!
Lema: “A fim de que todos sejam um, como tu, Pai, estás em mim e eu em ti” (Jo 17, 20-21).
3 ° Dia – Tema: Eucaristia: Alimento da Unidade e da fraternidade Social.
A Eucaristia dominical e o domingo é uma grande escola de caridade, de justiça e de paz, um projeto de solidariedade, impulso para alterar as estruturas de pecado. Longe de ser evasão, o domingo cristão é antes profecia que obriga os crentes a seguir Jesus, que veio anunciar a Boa Nova aos pobres e libertar os oprimidos (Lc 4,18-20). Na escola do domingo, os fiéis se tornam “agentes de paz. Na comunidade cristã, os pobres devem sentir-se como em sua casa. Sem esta forma de evangelização, o anúncio do Evangelho corre o risco de não ser compreendido. O cristão deve debruçar-se sobre a fome, o analfabetismo, as novas pobrezas, a solidão, a marginalização, as drogas, a violência. É preciso decifrar o apelo que Cristo lança à nossa fé a partir do mundo da pobreza. A caridade hoje requer maior capacidade inventiva. É hora de uma “nova fantasia da caridade” principalmente neste tempo pandêmico.
Como diz a oração das oferendas, o pão e o vinho são frutos da terra e do trabalho do homem e da mulher. Isso significa que neles há muito trabalho incorporado. Há muita vida e muito suor: “A ideia de Jesus é genial: reunir os homens e mulheres na unidade, partindo não das ideias, mas da matéria. A força da unificação e conciliação dos homens e mulheres, a energia oculta que nos une é Cristo, mas Cristo quer que esta energia seja colhida e simbolizada no pão e no vinho. Porque o pão e o vinho nos unem na mesa e são o símbolo desta união… E o pão e o vinho significam que só podemos realizar a união através da produção. O Pão nasce da terra, mas para ser pão deve passar pela mediação do homem e da mulher. O pão simboliza o produto indispensável à vida do homem e da mulher e é aquele produto que mais precisa de mediação: do campo à ceifa, à debulha, ao moinho, à panificação. São pelo menos quatro mediações, sem levar em conta a distribuição. A Eucaristia nos lembra o empenho de fazer comunhão entre nós passando pela produção.
Seria longo sinalizar todas as mediações necessárias para a produção do pão e do vinho. Mas é importante para compreendermos que o pão não é apenas pão e o vinho não é vinho tão somente, mas sim frutos de relações sociais. São, na verdade, a vida de nossos irmãos e irmãs incorporada neles. Quantas pessoas estão engajadas em sua produção! Para pensarmos o plantio, é necessário pensarmos a preparação da terra feita pelo camponês(a), os instrumentos necessários para essa tarefa: a enxada, o arado ou o trator. Esses, por sua vez, dependem dos que trabalharam nas minas, colhendo o minério de ferro, em circunstâncias extremamente perigosas, como também dos operários(as) que os produzem nas fábricas. Normalmente, a colheita é feita pelos boias-frias, cuja vida de sacrifícios conhecemos. Para chegar à cidade, o pão e o vinho necessitam do transporte. Caminhoneiros que percorrem grandes distâncias, enfrentando, a cada dia, os perigos de nossas estradas. Há ainda os que
trabalham na produção da farinha nas indústrias, os que trabalham nas padarias e no comércio.
O ser humano — homem e mulher —, no trabalho cotidiano, busca o sustento da vida diária, pois é um ser de necessidades. Seu trabalho visa produzir o necessário para que a vida possa ser produzida e reproduzida, através do consumo do fruto de seu trabalho. E como diz o Eclesiastes: “Vejam: a felicidade do homem e da mulher está em comer e beber, desfrutando o produto do seu trabalho… E compreendi também que é dom de Deus que o homem e a mulher possam comer e beber, desfrutando do produto de todo seu trabalho” (Ecl 2,24; 3,13). No entanto, quando o homem e a mulher não podem usufruir o produto de seu trabalho, surge a injustiça, que manifesta a quebra das relações de igualdade e impede que a vida seja vivida na fraternidade de irmãos e irmãs, numa mesma casa, cidade ou país.
Quando, numa sociedade, há pessoas que não têm acesso ao produto de seu trabalho, podemos questionar sua organização, pois essa desigualdade revela a injustiça presente nas relações sociais. Ao negar o trabalho aos trabalhadores(as), o pão não pode ser partilhado de modo fraterno, pois o desemprego, se não mata, machuca demais. Quando a concentração da terra chega a níveis insuportáveis, como no Brasil, o pão não pode chegar à mesa de todos. Quando há indigência na metade da população brasileira, o pão não pode estar presente na mesa de todos, como alimento que dá sustento e alegria de viver. Essa realidade está em contradição flagrante com a proposta de At 4,34: “Entre eles ninguém passava necessidade, pois aqueles que possuíam terras ou casas as vendiam, traziam o dinheiro e o colocavam aos pés dos apóstolos; depois, era distribuído a cada um conforme a sua necessidade”. O pão econômico explicita as relações de trabalho de uma sociedade. No nosso caso, o pão econômico, mal partilhado, conforme as estatísticas, revela que nossa sociedade, marcada pela desigualdade, priva muitos do exercício da cidadania plena. Mostra que a exploração continua imperando nas relações de trabalho, pois os que detêm o capital acabam mantendo os que trabalham numa situação de dependência.
O mesmo pão que comemos na nossa casa está presente na mesa do altar. Ele é fruto do trabalho do homem e da mulher, do campo e da cidade. O pão e o vinho revelam que a economia é a base da liturgia: “Trata-se de compreender a articulação entre o pão, fruto do trabalho comunitário dos homens (e mulheres) e que se troca entre os produtores, e o pão, matéria da oferta eucarística. Em um segundo nível de profundidade, é preciso articular o pão do sacrifício com o próprio corpo do profeta que se oferece na história nas lutas pela justiça, pela construção do Reino. Pão do trabalho, pão da oferta, o corpo do mártir como pão eucarístico. Isto é saber articular economia e eucaristia, a essência do cristianismo.
Numa sociedade em que a economia já não mais se preocupa com o bem comum das pessoas, mas única e exclusivamente com o lucro, colocando a produtividade e as leis de mercado como parâmetros absolutos, a Eucaristia deve se tornar um gesto profético em favor da justiça e da partilha. A Gaudium et Spes, texto do Vaticano II, mostra que a economia deve estar a serviço das pessoas e de toda a comunidade humana: “A finalidade fundamental da produção não é o mero aumento de produtos, nem o lucro ou a dominação, mas o serviço do homem e do homem completo, atendida a hierarquia das exigências
de sua vida intelectual, moral, espiritual e religiosa; de todo homem, dizemos, de qualquer comunidade humana, sem distinção de raça ou de região do mundo”.
O pão é fruto do trabalho do pobre. Tirar o pão do pobre e oferecê-lo a Deus é, na verdade, como diz o texto bíblico, matar o filho na presença do pai. Nesse sentido, a base da Eucaristia é a economia. Por isso, toda Eucaristia celebrada deve apontar para a partilha real dos bens, retomando hoje e sempre a experiência utópica das primeiras comunidades cristãs (At 2,42-47; 4,32-35). A Eucaristia nos relembra o grande dom de amor que Jesus nos deixou como sinal de sua presença no meio de nós. Sua vida foi toda perpassada pela vivência eucarística: partilha do pão, compaixão pelos pobres, acolhimento dos pecadores e doentes. Em seu testamento, ele disse: “Fazei isto em memória de mim” (Lc 22,19). O “isto” que Jesus pede que façamos “abre-se para uma perspectiva exigente, oblativa, de doação completa da vida. ‘Fazei isto’ significa celebrar o mistério eucarístico, atualizar a memória de Jesus. ‘Fazei isto’ implica doar a vida cotidianamente. ‘Fazei isto’ significa repartir o pão em todas as suas dimensões e sentidos”.
Felizes nós, os convidados, que nos sentimos honrados e dignificados pela graça da Eucaristia. Comungar é um dom imerecido que confere ao povo cristão uma dignidade incomparável. Somos transformados naquele que recebemos, somos contemporâneos, concorpóreos e consanguíneos de Cristo, consortes da natureza divina. Com Ele somos um só ser, uma só coisa, um só espírito. A Eucaristia é nossa elevação e promoção da dignidade humana. A dignificados pelo Senhor, iremos respeitá-lo nos irmãos, especialmente nos pobres, reconhecendo sua dignidade. É indigna a Ceia do Senhor onde há indiferença pelos pobres. A Eucaristia nos torna defensores e profetas da dignidade humana.
O Papa São João Paulo II quando visitou a Índia em 1986, rezando diante do túmulo de Gandhi em Nova Dehli, ficou longo tempo tocando com sua mão a pedra da sepultura onde estão escritos os sete pecados sociais da humanidade moderna: “Política sem princípios; Riqueza sem trabalho; Prazer sem consciência; Conhecimento sem caráter; Economia sem ética; Ciência sem humanidade; Religião sem sacrifício”.
Fratelli Tutti é um convite ao diálogo generoso a ser acolhido por todas as pessoas. Eis a possibilidade para encontrar novos itinerários, a partir das indicações do Santo Padre. Louvado seja Deus pela coragem do Papa Francisco que, com sua voz profética, aponta para o esvaziamento das palavras que consolidaram o ideário de um mundo moderno – liberdade, justiça, democracia e unidade. O Santo Padre também adverte a respeito do atual sistema econômico: não gera vida. Ao contrário disso, aprofunda desigualdades sociais.
A Encíclica é um convite a cada pessoa para efetivamente participar na reabilitação de uma sociedade que precisa curar as suas feridas. O texto do Papa Francisco estimula a reflexão e as ações concretas ante aqueles que permanecem caídos e feridos, nossos irmãos. Uma pergunta interpelante: seguiremos o exemplo do Bom Samaritano ou permaneceremos indiferentes à dor de nosso semelhante? A Casa Comum, profetizada na Laudato Si’, exige uma nova fraternidade que a habite e a construa. Isso, no entanto, só será possível – segundo Francisco – “se se aceita o grande princípio dos direitos que brotam do simples fato de possuir a inalienável dignidade humana”. A paz real e duradoura – diz ele – só é
possível “a partir de uma ética global de solidariedade e cooperação ao serviço de um futuro modelado pela interdependência e a corresponsabilidade na família humana inteira”. Segundo o Papa Francisco, “esta Carta Encíclica, sobre a fraternidade e a amizade social, tem por título a expressão que São Francisco de Assis usava para se dirigir a todos para lhes propor uma forma de vida com sabor do Evangelho (FT 1). São Francisco propunha uma ‘fraternidade aberta que permite reconhecer, valorizar e amar cada pessoa, para além do contexto físico, para lá do lugar do mundo onde tenha nascido ou viva’ (FT1)”.
A lógica fraterna do novo caminho que a encíclica insiste é: “O árduo esforço por superar o que nos divide, sem perder a identidade de cada um, pressupõe que em todos permaneça vivo um sentimento basilar de pertença” (FT 230). Os firmes laços familiares e fraternos sempre superam as brigas por meio do diálogo e da reconciliação. Vale lembrar que, como diz o Papa Francisco, paz não é apenas ausência de guerras, mas é o empenho pela dignidade e protagonismo de todos e todas. Francisco de Assis soube encarnar a opção pelos pobres fazendo-se um com eles.
Oração ao Criador
Senhor e Pai da humanidade, que criastes todos os seres humanos com a mesma dignidade, infundi nos nossos corações um espírito fraterno. Inspirai-nos o sonho de um novo encontro, de diálogo, de justiça e de paz. Estimulai-nos a criar sociedades mais sadias e um mundo mais digno, sem fome, sem pobreza, sem violência, sem guerras.
Que o nosso coração se abra a todos os povos e nações da terra, para reconhecer o bem e a beleza que semeastes em cada um deles, para estabelecer laços de unidade, de projetos comuns, de esperanças compartilhadas. Amém.
Pe. Marco José de Almeida